Ilha dos Casos Raros", montada em 1927, causou dores de cabeça em Nahas, autor que ganha estudos de Tânia Piacentini. Foto abaixo.
modernista de SC
Florianópolis - Nicolau Nagib Nahas não foi apenas um dos tantos poetas da década de 20 em Santa Catarina. Mais do que isso, ele é apontado como um dos primeiros autores modernistas do Estado, talvez o pioneiro, ao contrário do que repetem estudiosos da literatura local, que situam os primeiros representantes desse movimento apenas nos anos de 1940 e 1950, através do Grupo Sul.
A conclusão é confirmada pela professora Tânia Piacentini, doutora em língua portuguesa, após uma atenta leitura de parte do acervo deixada por Nicolau e que se encontra nas mãos de descendentes. Tânia se baseia principalmente na peça "Ilha dos Casos Raros", apresentada no Teatro Álvaro de Carvalho (TAC), em 1927, causando grandes polêmicas em todo o Estado e dores de cabeça em seu autor.
"Ele é modernista quando trabalha com alegorias, quando ele coloca o povo em cena, através de diversos personagens", destaca. "Além disso, Nicolau Nagib faz um resgate das diferentes linguagens, desde a popular até a língua padrão", tornando a peça "um espelho da época". Uma acentuada preocupação social permeia quase toda a sua obra poética.
O nacionalismo também está presente na obra do escritor e agitador cultural, como a valorização "do local onde ele vive", uma das principais características do modernismo de 1922, iniciado em São Paulo. O autor utiliza muito bem a "ironia e a sátira", avalia Piacentini, através dos seus personagens, como o eleitor que pede um pleito limpo e transparente, ou o fiscal de minas que representa a ineficiência do serviço público. "Ele faz tudo isso com personagens concretos, sem ser popularesco, dispensando a linguagem erudita e usando quadrinhas populares, cantos ou declamações", acrescenta Tânia. Ela vê nos poetas, escritores e movimentos culturais da década de 20 "excelentes fontes de pesquisas em muitas áreas do conhecimento".
"Ilha dos Casos Raros", em especial, "resiste a uma leitura do leitor de hoje, quase cem anos depois", onde se "consegue indagar como era a vida das pessoas naquele tempo". É um texto "que permanece porque coloca perguntas ao leitor". Os poemas de Nicolau seguem a mesma linha. Nos levam a questionar "qual era a vida literária, quais eram as instituições culturais, que jogo de forças havia e como elas funcionavam no período". Por uma série de circunstâncias históricas o trabalho do grupo de Nahas não prosperou. A agitação e a produção cultural da década de 20 sofreram o primeiro revés com a revolução de 1930, que marca o início de um período de intensa radicalização política e ideológica que se estende até 1945 - Revolução Constitucionalista de 1932, Aliança Nacional Libertadora, Ação Integralista Brasileira, Intentona Comunista de 1935, fascismo, nazismo, comunismo, Estado Novo (ditadura de Vargas) e Segunda Guerra Mundial. Os espíritos da época voltaram suas atenções para os embates políticos, as disputas ideológicas e partidárias, as ações militares e as lutas pela redemocratização. A produção literária no Brasil e em Santa Catarina fica congelada e muito pouco se produz.
O grupo ligado à Academia Catarinense de Letras (ACL) se fortaleceu durante o período, enquanto os remanescentes do Centro Catarinense de Letras se dispersaram: Maura de Senna Pereira, por exemplo, foi para o Rio de Janeiro. Nicolau morreu em 1934. Uns largaram o ofício, outros se empenharam na militância, muitos trocaram de grupo ou foram tratar de ganhar a vida e sustentar as famílias em tempos difíceis. Apesar disso, ficou uma produção que precisa ser estudada, assim como a própria década de 20, deixada em segundo plano pelos vitoriosos de 1930.
A vida é assim:
Ora é a Lei amordaçando o Povo;
Ora é o Povo em massa se insurgindo
Contra o Direito e a Lei!
O pobre com a Razão espesinhado;
O rico criminoso dominando...
"O progresso é lento
E, a Evolução é complexa"
Dizem os sabios...
E os proprios sabios são
Os pregoeiros da Revolução...
* Anexo mantém a ortografia original.
sacudiu província
Florianópolis - "Ilha dos Casos Raros" foi uma "revista de costumes" com abordagem "crítico-humorística", escrita e dirigida por Nicolau Nagib Nahas, apresentada pela primeira vez em 1o de setembro de 1927, no Teatro Álvaro de Carvalho (TAC). Em dois atos, 15 quadros e 22 números musicais, a peça sacudiu com irreverência a pacata Florianópolis, então com cerca de 20 mil habitantes.
Nesse dia, o TAC "apresentava um aspecto festivo das noites de gala. Frisas, camarotes, platéia, tudo repleto de uma multidão barulhenta", segundo o jornal "Folha Nova". Com cenários de Eduardo Dias e a presença de importantes músicos do Estado, "Ilha dos Casos Raros" se concentrou nos costumes, hábitos e tradições da Ilha de Santa Catarina. Estão presentes desde caçadores e fiscais de minas até personagens, como a Liberdade de Pensamento e Liberdade do Porrete e Justiça.
O ator Rodolfo Bosco declamou um verso em que fazia referência à liberdade de imprensa e a platéia compreendeu a "alusão aos que pretendem calar os jornalistas a porrete e a bala" e "prorrompeu vibrante salva de palmas". Era uma referência ao jornalista Crispim Mira, morto a tiros, fato que "o povo ainda não esqueceu", segundo o jornal da época. Também desfilaram no palco personagens populares como o almofadinha, a melindrosa e o mascate.
Foi um tabefe no gosto do público. "A peça é bem arranjada e agradou", diz o jornal "República", em 3 de setembro. "Encerra muito humorismo, boas críticas, se bem que um tanto pesadas algumas e demasiadamente pessoais, outras", embora o jornal "Folha Nova" tenha achado diferente: "A crítica foi feita com brandura para não arranhar mui profundamente a epiderme dos atingidos. É bem feita".
Mas o fato é que alguns trechos da primeira apresentação foram substituídos na segunda, "despida das críticas pesadas que feriram suscetibilidades". Com isso, diz o "República" de 13 de setembro, "tornou-se mais simpática à platéia". O autor do comentário lembra que se fosse apresentada no Rio de Janeiro, por exemplo, "a peça teria sido bem aceita, apesar das críticas". Ao fazer as alterações sugeridas, Nicolau "curvou-se às exigências do meio em que vive".
Os originais da peça musical estão com a família do autor, mas as alterações feitas se perderam. As partituras originais de todas as músicas do espetáculo também foram preservadas, permitindo sua remontagem. "Os seus associados não se presumem deuses das letras, querendo ser, apenas, cultores modestos da arte e da vernaculidade", diz o editoral de apresentação da revista do Centro Catarinense de Letras, lançada no dia 4 de janeiro de 1925m na União Beneficente e Recreativa Operária (Ubro). O centro surgiu em oposição à Academia Catarinense de Letras (ACL).
Ao contrário dessa entidade, o centro incorporou intelectuais negros, como Ildefonso Juvenal, e mulheres - Antonieta de Barros, negra, e Maura de Senna Pereira, detalhe observado pelo historiador Carlos Humberto Corrêa e outros autores. Também estavam lá intelectuais de esquerda, como Sebastião Vieira, José Rodrigues da Fonseca e Porfírio Gonçalves, presentes na criação da primeira direção estadual do Partido Comunista Brasileiro (PCB), em 1939, além de Arthur Galleti, conhecido anarquista catarinense. José Lupércio Lopes, Anfilóquio Gonçalves, Araújo Figueiredo, Trajano Margarida e Juvenal Melquiadores de Souza, com Laércio Caldeira de Andrade, Crispim Mira e Carlos da Costa Pereira também integraram o grupo.
Impressa em excelente papel, a revista ganhou quatro edições apoiadas pelo governador Antônio Pereira e Oliveira. Foi dirigida por Anfilóquio Gonçalves, tendo como redatores o professor Barreiros Filho, Oscar Ramos, Hermínio Millis e Odilon Fernandes. Nicolau Nahas atuou como tesoureiro do centro, extinto em 1926.
A revista publicou textos de poetas e escritores como Luis Delfino, Delminda Silveira, Horário Nunes Píres, Alfredo Xavier Vieira e Jovita Lisboa e de dirigentes e membros do centro. A oposição à ACL não era gratuita, mas expressava o repúdio intuitivo às idéias positivistas de José Boiteux, o autoritarismo intelectual de Altino Flores e, em parte, de Othon Gama d'Eça. Positivismo também solidamente instalado no Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina (IHGSC).
também fez poesia
"Canções Incultas" é o título da obra poética de maior repercussão de Nicolau Nahas, editada em 1922 pela Livraria Central (Florianópolis), com introdução da poetisa Delminda Silveira. Os poemas, "derramam o sentimento contido no coração de um jovem órfão do maternal amor, contrariado nas suas nobres e belas aspirações", diz. "Este simpático jovem patrício é, por todos os respeitos, digno de agrado e proteção despendidas com todos aqueles que se distinguem unicamente pelos seus nobres esforços e merecimento", avalia Delminda.
"São versos singelos, mas, a meu ver, verdadeiros versos, porque não há, nas 'Canções Incultas', esses enfeites da retórica, esses tropos que, mal aplicados, desprezam, muitas vezes, o coração - lar da poesia - e tentam elevar o pensamento ao auge do sublime", avalia M. Silva de A Notícia de 21 de abril de 1922. No livro, o autor revela "todo o sentimento de sua alma", devendo "ser lido com todo o coração, porque é livro de um poeta, muito estudioso e muito amigo do seu torrão natal".
Quatro anos após o lançamento, o intelectual gaúcho Jorge Bahlis faz um comentário na revista "O Cedro", de Porto Alegre, de 5 de junho de 1926. "Poesias belas, sinceras, verdadeiros gritos de um coração amante, misto de guerreiro e poeta", diz. "Trazendo nas veias o sangue oriental, e no cérebro ardente as mais estranhas fantasias, o jovem poeta catarinense tinha forçosamente de se impor." A leitura vislumbra um escritor "amoroso, sentimental ao extremo, justo, bondoso, e, sobretudo, altivo para com os pseudograndes, e humilde para com os humildes", sendo "um emotivo. Seus versos encantam pela emotividade e pela naturalidade". Se ele canta uma "paisagem bela, temos a impressão de a estar vendo; se descreve a nostalgia das almas exiladas, sentimos toda a dor dos infelizes". Innocêncio Campinas, no "República", de Florianópolis, em 7 de setembro de 1929, descreve um autor "cheio de vontade e rico de talento, lendo as obras dos melhores poetas, nacionais e estrangeiros, seguindo as pegadas dos mais afamados mestres", sendo "apegado aos livros".
Mas "Canções Incultas" não recebeu apenas elogios. A revista "O Itiherê", editada em Paranaguá (PR), de setembro de 1922, fala do "florido de um livro de versos interessantes, expressão de seus primeiros passos na juventude e na poesia, na onda de enlevos, a suspirar pelas jovens que passavam ligeiras, esbeltas, ou escondiam-se das janelas, num maltrato de amores, amuadas, ingratas".
O "Jornal Santa Catarina", de Florianópolis, destaca o "trabalho de um estreante" que "não é um lavor artístico, apenas uma obra com defeitos, aliás, tão comuns nos que começam". Mas eles não são tão graves que levem a "acusações à sua pessoa, como fazem os críticos de meia tijela" e deseja que Nicolau "estude bastante, leia os nossos melhores poetas", logrando "triunfos na arte poética".
O crítico Francisco Zicarelli Filho, em "O Estado do Paraná" de 13 de janeiro de 1925, acha que "se no seu todo não é uma obra-prima", mas que, "incontestavelmente, encontramos nesse mesmo livro, enfeixadas algumas produções de merecimento, de valor, dignas mesmo do melhor acolhimento e efusivos encômios". Observa que "Nicolau Nahas não é um escravo da forma, um burilador do verso, é mais um artista espontâneo que se não preocupa muito com a perfeição". Mas reconhece a "afirmação sólida e irrefutável do talento do jovem Nahas". Antes de "Canções Incultas" Nicolau havia lançado Hosanas (1918). Mais tarde surgiu "Boas Festas" (1930) e, postumamente, "Versos de Minha Vida", reunidos e editados pela mulher Carmem e os filhos, em 1948. (CM)
- Nagib Nicolau Nahas, pai de Nicolau Nagib Nahas,
nasceu em Beirute (Líbano) em 1875, casado com Jamille Malty, tendo chegado ao Brasil no final do século 19 e se estabelecido na cidade de Campos (RJ).
- O casal teve cinco filhos, todos nascidos no Brasil.
Entre eles, Nicolau Nagib Nahas, que nasceu em 2 de março de 1898, em Campos (RJ).
- Nicolau casou com Carmem Hoffman no dia 10 de setembro de 1922. Nascida em 24 de setembro de 1902, ela era filha de um importante comerciante de Palhoça, Pedro Egídio Hoffmann, casado com Maria Lehmkuhl.
- Além de excelente orador, poeta e dramaturgo, Nicolau foi escrivão de cartório, oficial do registro civil, jornalista, capitão da Guarda Nacional, tenente da Polícia Militar. Foi maçom, membro da Irmandade do
Senhor Jesus do Passos, dirigente de entidades como o Avaí (fundador), União Operária, clubes Concórdia e Guarani e da Sociedade Musical União dos Artistas.
- Nahas morreu às 9h40 do dia 26 de fevereiro de 1934, de tuberculose, aos 35 anos. Foi sepultado inicialmente no cemitério da Irmandade dos Passos, sendo transferido para o cemitério de Palhoça em 1939, onde, em 1958, ganhou um jazigo perpétuo.
ESTA MATERIA FOI PUBLICADA NO JORNAL A NOTICIA DE JOINVILLE, E ELABORADA PELA DOUTORA EM LÍNGUA PORTUGUESA TÂNIA PIACENTINI, MUITO OBRIGADO DRA TÂNIA A FAMILIA FICA MUITO FELIZ...MUITO OBRIGADO
ASSIM COMO EU TODOS NÓS DA FAMILIA TEMOS MUITO ORGULHO DO MEU AVÔ NICOLAU, NÃO CHEGUEI A CONHECER ESTE GRANDE ESCRITOR E POETA, CRIEI GOSTO PELA POESIA LENDO SEUS LIVROS, MEU AVÔ FOI O PRIMEIRO ORADOR DO AVAI FUTEBOL CLUBE, ACLAMADO EM REUNIÃO DE DIRETORIA EM 05 DE MARÇO DE 1925.
UM GRANDE ABRAÇO A TODOS.
TÚLIO BEIRINHA...
Um comentário:
Bom dia!
Grande homem, seu avô!
Estou a pesquisar, para meu doutorado sobre o Centro Literário e Recreativo Castro Alves, fundado também por seu avô.
Acaso a família teria algum documento para que eu possa analisar?
Grata,
Sidneya Gaya
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